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Uma aventura no Porto
17 août 2009

LEITURAS DA PERIFERIA

boa_morte_manuel_de_freitasOctavio Paz, numa carta ao seu amigo Roger Caillois, escreveu : «En écrivant ces lignes me reviennent en mémoire les constructions circulaires que les anciens Mexicains consacraient au vent, à Quetzalcóatl, dont l’un des attributs était la conque marine, emblème poétique commun à Mallarmé et à Dario. Les textes de Pierres Réfléchies sont, comme la conque marine, à la fois finis et maîtres de résonances lointaines. Intercommunication continuelle entre la matière et l’esprit précisément sous leurs deux formes extrêmes : la pierre et le mot.». É precisamente neste quadro de extremos que se delineia o penúltimo livro de Manuel De Freitas. Com efeito, é junto à pedra – e neste caso trata-se dum rochedo – que surge a grande interrogação do livro Boa Morte : «que mais, senão a morte,/ podes pretender da vida?». Desde logo, a imagem que se consubstancia neste primeiro poema : é a imagem do mistério da Esfinge e do silêncio que emerge do mar : «As ondas do mar/ de Agosto/ nada respondiam». A partir daí, o livro agita-se e reveste-se de sinuosas conchas onde passado e presente se mesclam. Porém, é incontestável a progressiva narrativização do livro cuja marca mais pronunciada é o pretérito imperfeito : «Havia». De facto, não se trata, como já pude ler, dum simples registo de viagem na geografia da Madeira e tão pouco é, este livro, a metáfora da vida. Melhor, é sim a metáfora do que já não existe. Do irrecuperável. É, portanto, um livro que remete para o precário da vida, para a efemeridade e o inevitável da morte. Sim. Tudo se morre. Isto é uma quase-certeza para o poeta ; resta, agora, saber se a possibilidade duma boa morte existe, ou até mesmo a possibilidade duma regeneração. Daí, o fluxo de interrogações às quais o poeta não dá ou não encontra respostas, numa espécie de abandono : «Choravas, doutra maneira,/ a juventude derrotada,/ desatenta ao alarme das gaivotas/ e que já nem o garrote da memória salva».

É um livro forte e bem estruturado, no qual as brechas do presente desembocam numa escrita mnemónica ligando fortemente lugares sem vida a momentos e indivíduos familiares que, por fim, tornam o espaço já habitável e de igual modo recuperável. Muito mais que uma viagem ou roteiro pela Madeira ; é, sim, uma viagem pela morte que possibilita um regresso à vida.

Nem sempre fui muito amável com o Manuel de Freitas, mas devo reconhecer que gostei deste livro. Além do mais, a atitude do poeta que perante a rarefacção da sua obra – e após ter conversado com a Professora Rosa Maria Martelo – disponibilizou este exemplar para mim, é de saudar.

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